sexta-feira, julho 22, 2011

Para que serve um pré-vestibular?

Oxalá o nosso país tivesse oportunidade para todos aqueles que quisessem seguir o ensino superior, gratuito e de qualidade. Não é possível. Na boa parte do mundo rico, o acesso a instituições de alto padrão é pago, pelo menos por aqueles que podem pagar. Há subsídios sim, inclusive para atrair bons alunos, inclusive de outros países. Há muitos talentos brasileiros e de diversos outros países em grandes universidades pelo mundo. Lendo “Muito além do nosso eu” de Miguel Nicolelis (brasileiro, neurofisiologista), é fácil perceber como as universidades norte-americanas são uma verdadeira torre de Babel. No mesmo espaço convivem chineses, indianos, espanhóis, russos, brasileiros, franceses, entre outros. É fácil também de entender o caminhão de prêmios Nobel, a enxurrada de dinheiro para pesquisa e o absoluto domínio dos rankings internacionais de excelência-influência-publicação do planeta.


Voltemos ao Brasil.

Escolhi ser professor e quis o destino dos fatos que estivesse desde 2008 comandando um pré-vestibular. Como não há vagas para todos os alunos bons e determinados, o vestibular existe. Na esteira do exame, o pré-vestibular existe. Nele, atendo algumas centenas de alunos com um único sonho: estudar na universidade pública brasileira. Eles vêm de escolas particulares, de escolas públicas, vêm do mercado, vêm de cursos que os tornaram tristes, vêm de outros estados, deixam seus pais, deixam suas casas, seus pertences, congelam alguns sonhos, abandonam outros. Metade dessas fileiras de candidatos aspirante às vagas de medicina. É uma vida ingrata, dura, incerta. Eu estou vivendo isso a cada dia que os enfrento em minha sala de trabalho. Não é educação o que faço. Ou não era pra ser. Estou em uma fase que acho que é. Já não sei mais. Quanto mais “ganho” experiência no ramo mas percebo que ele – o pré-vestibular - não deveria existir. Ele não é saudável para ninguém. Mas está voltando a ser de absoluta necessidade.

Vamos fazer uma conta. Uma faculdade particular de medicina de Brasília cobra R$ 3,8 mil por mês (ver site http://www.escolasmedicas.com.br/mensal.php) . Tomando cinco anos de graduação, um novo médico custa R$ 228.000,00, ou seja, U$ 147.000,00. Fazer medicina em Harvard custaria U$ 360.000,00. Na Uni-BH, a mensalidade é de R$ 7,1 mil. Sai igual a Harvard. Na USP, UnB, ESCS, UFMG, UNICAMP não sai por nada.

Tive um aluno, que agora faz medicina, que ficou oito anos no cursinho pré-vestibular. Um ano de cursinho sai por R$ 11 mil. Ele teria pago R$ 88 mil para entrar na ESCS (DF), uma das melhores faculdades de medicina do país (em função do seu potencial e de sua incontestável determinação, pude ajudá-lo com alguns descontos). Agora, não precisará desembolsar mais nada com seus estudos. Pelo menos no que se refere a mensalidades. Acho que valeu o investimento.

Mas o que está em jogo, não é só o poder pagar e então se livrar da pressão do vestibular. Sim, porque hoje em dia, falar em vestibular para as instituições privadas é, salvo raras exceções, uma brincadeira para crianças. As provas são repetidas, excessivamente fáceis, de correção ultra-mega-hiperrápida, de transparência zero. Não há gabarito oficial. Não há recursos. Não há tempo para a correção das redações. Os pais cedem ao argumento de não assistirem ao sofrimento dos seus filhos ante as apostilas dos cursinhos e a possível reprovação no vestibular das "federais" e fazem a opção de pagar a faculdade particular. Mas estamos falando de outra coisa.

Sem ritmo, sem dedicação exclusiva da maioria dos profissionais, sem pesquisa, sem grandes publicações, sem grandes parcerias, sem um conjunto de alunos de grande performance, com turmas iniciais lotadas, com semestres curtos, com grande evasão, com muita indisciplina durante as aulas, com grande desnível entre os alunos, posso afirmar: poucos sobreviverão. Sem um ambiente de prosperidade é muito mais difícil prosperar. Precisamos de exigências, de grandes mestres, de grandes desafios, precisamos de ver agilidade na nossa frente e dos nossos lados. Precisamos viver o curso superior e não deixar que o tempo se encarregue de lhe dar o diploma. “Deixe a vida me levar” interpretado pelo Zeca Pagodinho tem uma bela harmonia, mas tem uma letra preguiçosa e abandonada de objetivos.

Venha para a universidade pública e de qualidade. Não abandonem o seu sonho.

5 comentários:

Ana Gabriela Gewehr Vale disse...

Sábias palavras, lasneaux!!

Felipe Correa disse...

Assino embaixo de tudo que foi dito. Queria agradecer muito a você, Lasneaux. Aquele papo que a gente teve no início do ano foi crucial pra que eu nao desistisse da UnB. E valeu (muito) a pena, passei!

Abração! Felipe Santos Corrêa

Izabela Rodrigues disse...

Nicolelis fala de um "futuro tecnológico em que as visões catastrófiscas dão lugar ao otimismo e à esperança." Temos de procurar novas visões acerca de nós mesmos, de nossos cérebros... não nos subestimar! Ter fé.
Lasneaux, estou tentando não abandonar meu sonho! Obrigada pela ajuda. :D

solar disse...

Seu texto e muito animador.Quem tem dinheiro para investir em cursinho tudo bem e quem não tem? têm que se virar com a internet, livros, bibliotecas.Se as escolas públicas tivessem o mesmo empenho que as particulares não haveria tanta necessidade assim de cursinho.Mas, por outro lado até quem estuda em escolas particlares corre atrás de fazer cursinhos, pelo simples fato de não se sentir tão seguro.
Por tudo isso e muito mais, vale muito apena buscar realizar um sonho, não importa se ele demore um pouco a se realizar.

Anônimo disse...

A ESCS é uma excelente faculdade de medicina ?

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Provavelmente todos os professores de biologia brasileiros vão morrer sem ver um anfioxo. Mas passam mais tempo falando de...